sábado, 3 de setembro de 2016

Nesta ainda possível paz usufruída numa tarde domingueira em Cambeses, tive entre mãos uma jovem revista que se edita na Escola Secundária Alcaides de Faria, de Barcelos, e se denomina “Avenida do Minho”. 

Folheio-a de novo e, ao reler uma ou outra poesia, um ou outro artigo, surpreendo-me a pensar no inestimável valor de uma publicação deste género, tanto mais que atravessamos uma época caracterizada pela preocupante desvalorização da palavra escrita, enquanto suporte de criatividade literária e também jornalística. Uma época em que os audiovisuais, nomeadamente a televisão, quase anularam o gosto pela leitura, ao impor as suas efémeras imagens, como substituição das que a imaginação cria e mantêm como resultante do ato de ler.

Não pretendo aqui menosprezar as vantagens do audiovisual em favor da palavra escrita, porque acho que as duas podem perfeitamente coexistir. É, aliás, um princípio recentemente defendido no segundo encontro ibero-americano de jornalismo cultural, que teve lugar no México. E porque assim o creio também, continuo a manter a esperança de que o prazer da leitura resistirá a todos os avanços do audiovisual, esperança que assenta sobretudo no êxito que é, em cada escola, um jornal escolar.

Êxito bem evidente nesta jovem revista “Avenida do Minho”. Jovem não porque relativamente recente, mas porque é, na sua maior parte, fruto da criatividade dos jovens colaboradores, alunos dessa escola, muitos dos quais se revelam já como promissores escritores e poetas, bem como jornalistas, a não desmerecerem da actividade jornalística que em Barcelos é tradição.

De facto, se Barcelos não tem nenhuma individualidade tão célebre nas letras como outras terras as têm, no que respeita à actividade jornalística, possui uma tradição notável quanto à edição de jornais, conforme foi demonstrado nessa grandiosa e muito bem organizada exposição do ano de 1993, e que se denominou “A Imprensa Barcelense”.

Mas voltando à “Avenida do Minho”, não tenho dúvidas em afirmar que se trata de uma publicação valiosa, não apenas pelo seu conteúdo, pela cuidadosa ordenação dos temas, pelo aspecto gráfico, mas sobretudo, como se disse, porque se trata de uma publicação densamente povoada de vozes juvenis, vozes que deixam transparecer uma sensibilidade disponível para a investigação, para a criatividade literária, bem como para a actividade jornalística. Daí a grande diversidade de temas que vão da história à literatura, das ciências ao desporto, para gostosamente se demorarem no relato de viagens de estudo, e várias foram. Viagens que são marcos importantes na vida escolar. Aliás, todos guardamos no fundo da memória, as imagens afectivas e emotivas que viagens dessas deixaram em cada um de nós. Imagens indeléveis, a que nenhuma viagem de turismo, efectuada em idade adulta, se consegue sobrepor.

Vivemos numa época em que, como atrás se disse, cada vez se lê menos. Para a cura desse mal, a esperança está nas novas gerações, já que as outras foram desprevenidamente seduzidas por alguns meios de distracção de que participam passivamente e, quanta vez, mergulhadas em “apagada e vil tristeza”, já que a alegria de construir imagens através da leitura lhes está vedada. É uma época de fim de século considerada por muitos como desumanizada pela voragem da máquina. Uma época em que o consumismo tenta, e conseguiu já, ocupar o lugar da cultura.

É uma visão pessimista da qual me recuso a partilhar, embora não possa deixar de constatar que grandes alterações no quotidiano do Homem quase anularam o gosto pela descoberta através dos caminhos da imaginação. Essa imaginação, bem patente em muitos trabalhos a que os jovens deram forma, seduzidos pelo prazer da criatividade que a revista “Avenida do Minho” lhes proporcionou.

Mas, mais do que um incitamento à criatividade, é acima de tudo um incitamento à leitura, não só para os colaboradores, mas também para os restantes alunos, sem esquecer familiares e amigos, porque neste caso, o jornal é sempre um claro elo de ligação entre a escola e a comunidade.

Por tudo isto, a presença da “Avenida do Minho” é de aplaudir, como de aplaudir é o esforço de quem a dirige, e dos mais diversos modos colabora na sua realização. Tarefa absorvente, trabalhosa, como se imaginará. Mas também tarefa gratificante, porque fruto de um grande entusiasmo e empenhamento, aliados a uma certa dose de afectividade. Se assim não fosse, como poderia ela viver há já cinco anos?


Crónica publicada no Jornal de Barcelos de 15 – 7 – 93

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