segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Há muita gente que teme as transformações, sejam elas quais forem, tal como teme as mudanças, as revoluções (pacíficas), as novidades.

Também este pequeno lugar que Bouçó se chama e que continuo a considerar o meu berço, sofreu já, “no seu seio”, como diziam os românticos, profundas alterações, com o seu cortejo de benefícios e malefícios também.

A primeira e a mais acentuada foi há mais de um século, com o traçado da via férrea, chamado de “Ramal de Braga”, a qual cortou o lugar em dois e, pior ainda, cortou já a vida de várias pessoas, quer na célebre tragédia de 1916, quando ali perto um vagão desatrelado e carregado de pólvora e outros materiais perigosos explodiu, abalando casas e pessoas, quer na passagem de nível de Bouçó, felizmente agora sem utilização obrigatória, porque a recente estrada camarária disso defende.

Esta estrada que, tal como a via férrea, cortou campos produtivos e, consequentemente, o lugar de Bouçó, dividido agora em três pedaços. E se a estrada trouxe benefícios (ninguém o nega) também trouxe malefícios. Não me estou a referir a ter retalhado o lugar de Bouçó, nem tão pouco à insegurança que a velocidade desajustada de certos veículos que por aqui passam, possa causar. São perigos que cada um pode evitar em relação a si próprio.

Refiro-me a outro tipo de malefícios, a que aliás, já aqui aludi, e que, a exemplo do que se passa a nível mundial, nunca é demais insistir: os perigos da poluição, que a falta de regras e de vigilância desencadeiam por vezes, com gravíssimas consequências.

E, mesmo que não achem a propósito, eu insisto, porque não me estou a referir à poluição dos escapes das viaturas, embora esta seja bem nociva também, só que os venenos estão em relação direta com as quantidades.

Estou a referir-me à poluição que os meios de comunicação rodoviária proporcionam, ao proporcionarem a instalação de empreendimentos poluentes, porque instalados longe das vistas e sem outro objectivo que não seja o do lucro imediato, a custo seja do que for, obra desses modernos criminosos (ou pecadores, a quem o Papa já apontou o dedo acusador), que nos assustam, que assustam o mundo. E há-os de todos os níveis. Os que poluem os grandes rios, como o Vouga ou o Cávado, ou ainda o pobre do pequeno Este que em Cambeses passa a par da linha e a par da velha estrada, que de Braga vem, quase sempre a seu lado. Rios de grande ou pequeno curso. Poucos escapam e todos se sentem ameaçados.

Como ameaçados se sentem os fios de água que no subsolo de Bouçó correm limpidamente para alimentarem a fonte, o ribeiro e os pequenos poços que dão vida às pessoas, animais e plantas.

Já aqui falei deste receio que Bouçó começa a viver. Oxalá não volte a falar no assunto. E muito menos a falar de algo muito grave, que por hora apenas se teme e ainda se pode evitar perfeitamente. Eu quero querer que o perigo vai ser evitado.



Crónica publicada no Jornal de Barcelos de 1-7-1996

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