Há muita gente que teme as transformações, sejam elas quais forem, tal como teme as mudanças, as revoluções (pacíficas), as novidades.
Também este pequeno lugar que Bouçó se chama e que continuo a considerar o meu berço, sofreu já, “no seu seio”, como diziam os românticos, profundas alterações, com o seu cortejo de benefícios e malefícios também.
A primeira e a mais acentuada foi há mais de um século, com o traçado da via férrea, chamado de “Ramal de Braga”, a qual cortou o lugar em dois e, pior ainda, cortou já a vida de várias pessoas, quer na célebre tragédia de 1916, quando ali perto um vagão desatrelado e carregado de pólvora e outros materiais perigosos explodiu, abalando casas e pessoas, quer na passagem de nível de Bouçó, felizmente agora sem utilização obrigatória, porque a recente estrada camarária disso defende.
Esta estrada que, tal como a via férrea, cortou campos produtivos e, consequentemente, o lugar de Bouçó, dividido agora em três pedaços. E se a estrada trouxe benefícios (ninguém o nega) também trouxe malefícios. Não me estou a referir a ter retalhado o lugar de Bouçó, nem tão pouco à insegurança que a velocidade desajustada de certos veículos que por aqui passam, possa causar. São perigos que cada um pode evitar em relação a si próprio.
Refiro-me a outro tipo de malefícios, a que aliás, já aqui aludi, e que, a exemplo do que se passa a nível mundial, nunca é demais insistir: os perigos da poluição, que a falta de regras e de vigilância desencadeiam por vezes, com gravíssimas consequências.
E, mesmo que não achem a propósito, eu insisto, porque não me estou a referir à poluição dos escapes das viaturas, embora esta seja bem nociva também, só que os venenos estão em relação direta com as quantidades.
Estou a referir-me à poluição que os meios de comunicação rodoviária proporcionam, ao proporcionarem a instalação de empreendimentos poluentes, porque instalados longe das vistas e sem outro objectivo que não seja o do lucro imediato, a custo seja do que for, obra desses modernos criminosos (ou pecadores, a quem o Papa já apontou o dedo acusador), que nos assustam, que assustam o mundo. E há-os de todos os níveis. Os que poluem os grandes rios, como o Vouga ou o Cávado, ou ainda o pobre do pequeno Este que em Cambeses passa a par da linha e a par da velha estrada, que de Braga vem, quase sempre a seu lado. Rios de grande ou pequeno curso. Poucos escapam e todos se sentem ameaçados.
Como ameaçados se sentem os fios de água que no subsolo de Bouçó correm limpidamente para alimentarem a fonte, o ribeiro e os pequenos poços que dão vida às pessoas, animais e plantas.
Já aqui falei deste receio que Bouçó começa a viver. Oxalá não volte a falar no assunto. E muito menos a falar de algo muito grave, que por hora apenas se teme e ainda se pode evitar perfeitamente. Eu quero querer que o perigo vai ser evitado.
Crónica publicada no Jornal de Barcelos de 1-7-1996
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