terça-feira, 11 de outubro de 2016

Se alguém ainda sonha com um passeio tranquilo pelas aldeias de Barcelos, é sonho vão, sobretudo se segue pelas estreitas e antigas estradas camarárias, em tardes de domingo, e tem de atravessar locais onde funcionam cafés, e sobretudo discotecas.

Acontece isso mesmo perto de Cambeses, já em Nine, junto a uma discoteca, na estrada que liga as duas freguesias. Há os estacionamentos que são onde calha, e há os grupos de pessoas que ficam a conversar, parados na estrada, como se estivessem num jardim, e há os incautos e os “donos disto tudo”. Por estas razões torna-se necessário efectuar autênticas gincanas com a maior calma possível. Não sei quem tem autoridade para disciplinar estas coisas. Ali, parece que ninguém. O mesmo acontece em Cambeses, junto ao apeadeiro, onde por vezes o trânsito é um pandemónio. Só se avança à custa de perícia e paciência e, mesmo assim, os “toques” vão acontecendo, felizmente sem desastres pessoais, o que se deve à reduzida velocidade praticada, muito inferior à das gincanas desportivas.

E deixando estas coisas que ninguém parece interessado em fazer melhorar, evoco de súbito o trânsito nas cidades chinesas que me foi dado visitar: trânsito de tal modo emaranhado de ciclistas que só um motorista chinês, paciente como só o são os chineses, consegue enfrentar, avançando por entre este autêntico formigueiro de ciclistas sem molestar nenhum deles.

Para se fazer uma ideia, basta dizer que, só na cidade de Pequim, há cerca de sete milhões de bicicletas, disseram-nos, e acredito, tantas elas eram diante dos nossos olhos, a surgir de todos os lados, a meterem-se diante do autocarro, que se limitava a seguir cautelosamente e a buzinar constantemente. Não um buzinar agressivo, próprio de quem está enervado, muito à nossa moda, mas um buzinar de quem pede licença suave e quase que com um sorriso, que é coisa de que os chineses costumam deitar mão, nas mais variadas circunstâncias.

Em Taipé, capital dessa ilha que embora chamada de Taiwan, também é conhecida por Formosa, que foi assim que os marinheiros portugueses a acharam e chamaram, em Taipé, dizia, o trânsito também é caótico, mas os veículos de duas rodas aqui são motorizados, sinal de progresso, esse progresso que arrasta consigo um fantasma negro chamado “poluição”. Uma poluição já de tal modo acentuada que muitos dos motociclistas conduziam de máscara! Eu vi.

Não tenho nada contra os veículos motorizados. Antes pelo contrário. Mas que se gasta muita gasolina só por gastar, sobretudo nas emaranhadas tardes de domingo, lá isso é verdade. Mas como cada um tem o direito de gastar como quer…

O mesmo não dirão os donos de automóveis em Quala Lumpur, capital da Malásia, cidade moderna, de modernos arranha-céus e ruas amplas, bem como a cidade de Singapura, das mais limpas e ordenadas que é possível apreciar, porque nas horas de ponta nenhum automobilista pode circular nestas cidades, só. Tem de levar consigo companhia ou pedir a quem o leve. Isto na intenção de reduzir o tráfego de carros ocupados por uma só pessoa, como é tão vulgar na nossa terra. E se essa moda se fazia lei, também, cá pelos nossos lados?

Crónica publicada no Jornal de Barcelos de 10 – 2 – 1994

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