sexta-feira, 7 de outubro de 2016

Vou começar por afirmar publicamente que sou amiga das árvores, que gosto de as ver cuidadas e viçosas, cumprindo a missão que a natureza lhes destinou, que as protejo como posso, que me angustio e revolto com os incêndios de verão, e todos os anos temo pelos pinhais de Cambeses. Pinhais que ainda se vão mantendo quase intactos, apesar das ameaças que, por vezes, parecem pairar sobre eles.

Cresci numa terra onde as árvores abundam, árvores de fruto ou não, que vicejam na borda dos campos, árvores robustas, semi-selvagens, feitas “uveiras” a par de outras que nos presenteavam com pequenos frutos espontâneos e acidulados quase sempre. Puros. Bichentos às vezes. Naturais. Por tudo isto, repito, sempre gostei das árvores.

Mas há uma, em plena cidade de Barcelos, que não gostei de encontrar diante dos meus olhos. Não pela árvore, que é bela e viçosa, mas porque, tendo crescido num local inadequado, se interpunha entre mim e a bela fachada quatrocentista da nossa futura biblioteca municipal. Claro que a árvore não tem culpa de ter nascido ali. Culpa teve quem ali a plantou, sabendo, como é óbvio, que em breve ela iria interpor-se entre a fachada do belo edifício e o olhar de quem quisesse admirar essas pedras. E agora, que fazer?

A árvore é jovem e bela. Tão bela como a praça onde cresceu, uma praça com alma, com uma dignidade e características muito próprias. Uma praça rodeada de edifícios bem conservados, honrando assim aqueles que, tendo a seu cargo preservar bens dessa natureza, souberam defender esse conjunto arquitectónico de possíveis cobiças e sonhos megalómanos.

Praça bonita, repito, harmoniosa, sob o olhar da alta torre. Praça que, com a nova biblioteca a funcionar, se vai tornar, julgo eu, na sala de visitas da cidade.

Mas, e a árvore?

Que fazer com esse ser vivo? Que me perdoem os botânicos e técnicos de jardins, o atrevimento da sugestão, que é esta: - mudá-la para um outro local (tecnicamente já é possível, julgo saber).

A praça, já de si bela, pouco perderia se a árvore fosse retirada. E a árvore, se tratada com os cuidados que as novas técnicas possibilitam, poderia até lucrar se, num outro local, possivelmente mais apropriado, pudesse, em total liberdade, crescer mais ainda.

E quanto à bela e granítica fachada da nossa futura biblioteca, essa muito teria a ganhar porque poderia ser admirada do outro extremo da praça, e as suas portas, a descoberto, seriam claro convite a uma visita que o mesmo é dizer, à possibilidade de enriquecimento cultural. Essa riqueza, de que tão necessitado se anda nesta era de falsos valores, de materialismo exacerbado, de regras surdas, de tanta coisa negativa, desgastante e até predadora.


Crónica publicada no Jornal de Barcelos de 7 – 1 – 1994

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