quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Hoje vou falar da Quinta do Paço de Palmeira, cuja casa tive o privilégio de recentemente visitar, quinta que tendo sido pertença dos dignitários eclesiásticos de Braga, é hoje pertença de uma entidade bancária. Quinta que teve a sorte de, numa época materializada como a nossa, se ter encontrado um dia com o olhar de um homem que, sendo financeiramente poderoso, era também um homem sensível, amante da arte. Um homem que não se deixou ofuscar pelos sinais exteriores de riqueza nem abusou do poder que o dinheiro dá e, muito menos, se entregou, de corpo e alma, à sedução do poderio pelo dinheiro, já que parte da sua fortuna foi colocada ao serviço da cultura, do que é prova irrefutável a Fundação que ele deixou.

E se falo aqui na Quinta do Paço, de Palmeira, ali perto de Braga, é porque não posso deixar de evocar uma outra de igual nome, aqui em Cambeses, que simbolizada no seu vetusto edifício de vários séculos, falava de um passado quase tão antigo como a nacionalidade. Falava… mas já não fala porque desapareceu do campo visual.

Sede do concelho rural que Cambeses foi, as grandes e várias salas da Casa do Paço, de que muitos de Cambeses se hão de lembrar, não teve a sorte de receber a visita que a sua homónima de Palmeira terá recebido. Por isso as suas salas não foram restauradas nem nelas se instalaram móveis e objectos de arte que dessem testemunho vivo de um passado de séculos que, sem dúvida, seria motivo de orgulho para os habitantes deste velho Couto, tal com o a Quinta do Paço, em Palmeira, o é hoje para aquela freguesia, não só pela História, mas também porque é nome que anda na boca dos poderosos e ilustres, e também dos que simplesmente amam a arte e a história.

Do que foi a multicentenária Casa do Paço, do Couto de Cambeses, nada resta. Do que foi a sua remota grandeza, poucos vestígios há hoje. Sei que não adianta recriminar os homens do Poder de então, que tão facilmente deram autorização para que o desastre acontecesse. Um desastre legal, nada que as leis de então proibissem.

“Hoje talvez fosse diferente…” pensei quando, da velha casa do Couto me lembrei, ao percorrer essa outra de que aqui falo. E, inesperadamente, surpreendi-me a devanear. “Se esse homem do Louro, que tão perto vivia do velho Couto de Cambeses, tivesse passado por ali…”

Mas não passou. Nem ele nem nenhum santo protector dos edifícios que são pedras vivas, pedras que falam do passado. Para tudo se quer sorte. Até para as casas carregadas de séculos de História, como esta que foi a Casa do Paço do Couto de Cambeses, e que tão ingloriamente terminou. Sei que não adianta falar, porque já nenhuma solução pode haver, que restitua ao velho Couto a casa que foi símbolo do seu poderio. Tudo acabou. Ponto final.

Mas que esta terra, que ainda hoje é conhecida simplesmente por “Couto”, ficou mais pobre, sem dúvida que ficou.


Crónica publicada no Jornal de Barcelos de 17 – 6 – 1993

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