quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Li há tempos, não sei onde, um artigo onde se dizia contarem-se por centenas as invocações da Mãe de Jesus Cristo, que Maria se chamava.

Desde Nossa Senhora de Fátima ou de Lurdes, a Nossa Senhora do Ar ou dos Remédios, ou da Saúde, ou da Franqueira, muitas são, de facto, as invocações cujos nomes, no geral, andam ligados ao local do culto ou à intenção com que, pelo povo, e em tempos mais ou menos remotos, começou a ser invocada.

Na igreja de Cambeses, essa onde sempre tiveram lugar os momentos ligados à religião católica, mais importante da minha vida desde o baptizado, comunhão, crisma, casamento e outros baptizados, entre os quais o do meu primeiro neto, nessa igreja, dizia eu, a imagem da Virgem que mais me impressionou em tempos de meninice, era a da Senhora das Dores, envolta em cetins azuis e roxos, o rosto dolorido sobre o manto e, sobretudo, me impressionavam as sete espadas cravadas no seu coração, como símbolo da maior dor. Essa mesma imagem carregada de simbologia que, ainda hoje, em cada primeiro Domingo de Quaresma, na Procissão de Passos, tem um lugar de maior destaque na dramaturgia da Paixão que ali se efetua, numa tradição de séculos.

Tudo isto vem a propósito de uma imagem da Virgem que pude observar numa das igrejas da cidade da Velha Goa, a Basílica do Bom Jesus de que já aqui falei, essa mesma que guarda os restos mortais de S. Francisco Xavier.

Sob a invocação de Nossa Senhora da Esperança, essa imagem que assim despertou de modo particular a minha atenção, apresentava a particularidade de, em vez do tradicional manto imaginado pelos artistas ocidentais, ostentava a cabeça descoberta e o corpo envolto num belo sari que lhe cobria o ombro esquerdo deixando-lhe o braço direito livre para nele o Menino Jesus se sentar tranquilamente.

Imagem belíssima, exemplar perfeito da escultura religiosa indo-portuguesa, a qual se enquadra muito bem num rico altar de talha dourada barroca, esta de influência ocidental, à mistura com alguns elementos da arte indiana, como aliás acontece com muitos exemplares dessa mesma arte.

E porque me impressionou vivamente, não a esqueci, como terei esquecido algumas das muitas peças de arte religiosa cristã, onde o ocidente e o oriente se misturam, daí resultando uma beleza muito especial, rara no mundo da arte.

Crónica publicada no Jornal de Barcelos de 19 – 1 – 1995


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